Ano B – II Domingo do Advento

1ª Leitura: Is 40, 1-5. 9-11;
Salmo: Sl 84, 9ab-10. 11-12. 13-14;
2ª Leitura: 2 Ped 3, 8-14;
Evangelho: Mc 1, 1-8.

 

“Consolai, consolai o meu povo.” Assim começa o chamado “livro da consolação” do profeta Isaías destinado aos frustrados e desorientados exilados na Babilónia, cujo prólogo escutávamos na primeira leitura deste dia. Na fase final do exílio, surge a voz do profeta que pretende devolver a esperança e consolar o povo oprimido. Na verdade, o exílio mais que um problema político era um problema religioso.

O consolo, o conforto e o alívio que o profeta anuncia têm o seu fundamento no perdão de Deus. A um povo que interpretava o exílio como um castigo de Deus pelos pecados do povo, o Profeta anuncia o perdão de Deus: “esta perdoada a sua culpa”. O perdão de Deus é algo que conforta, algo que devolve a esperança. O perdão é uma espécie de “ressurreição”. Ao povo que vivia atormentado pela sua ruptura com Deus, Deus anuncia o perdão. E tal anúncio de perdão é feito ao “coração de Jerusalém”. Falar ao coração evoca a relação de amor entre os esposos, Deus como esposo pronúncia ao coração da sua esposa infiel, do povo pecador, a palavra recriadora do perdão, do reencontro e da comunhão. Deus fala-nos ao coração e diz-nos que os nossos pecados estão perdoados.

Nestes últimos dias, ouvi duas frases sobre o perdão que me fizeram pensar e que partilho convosco: “perdoar não é esquecer mas aprender a recordar de uma maneira diferente; perdoar é dizer a uma pessoa que ela é mais do que os seus actos!” Penso que estas frases ajudam-nos a perceber por que motivo o perdão de Deus é algo que nos consola e dá esperança. Apesar das nossas falhas e dos nossos erros, para Deus nós somos mais do que os nossos pecados. Para Deus nós somos filhos e por isso Ele é capaz de nos perdoar, de olhar para os nossos pecados não com rancor e ódio mas com ternura e compaixão.

Continuando a pronunciar a sua palavra de consolação e de esperança o profeta apregoa: “Preparai no deserto o caminho do Senhor”. A referência ao deserto recorda-nos subitamente o caminho do êxodo, o caminho do Egipto até a terra prometida. Deus está a preparar um novo êxodo para o povo que está exilado na Babilónia. Deus vai libertar o povo da Babilónia e conduzi-lo pelo deserto até Jerusalém. Tal caminho será um caminho geográfico. Na verdade, com a vitória de Ciro, o povo voltará para Jerusalém. No entanto, este também é um caminho espiritual. Assim como na sua peregrinação pelo deserto do Egipto à terra prometida, o povo de Deus aprendeu a relacionar-se com Deus assim também os exilados que regressarão à sua pátria estão chamados a redescobrir os caminhos da aliança e da fidelidade a Deus, caminhos esses que conduzem à felicidade.

Pela palavra do perdão e pela promessa do regresso à pátria, o profeta consola e devolve a esperança a este povo sofrido. No entanto, tal realidade não pode ser guardada em segredo. Tal realidade tem de ser anunciada e proclamada com alegria. A todos se tem de anunciar esta palavra de perdão e de esperança. É por isso que escutávamos na leitura a ordem: “ Sobe ao alto de um monte, arauto de Sião! Grita com voz forte, arauto de Jerusalém! Levanta sem temor a tua voz e diz às cidades de Judá: ‘Eis o vosso Deus. O Senhor Deus vem com poder, o seu braço dominará’”. Deve haver mensageiros/evangelistas que anunciem a boa-nova/evangelho ao povo: Deus libertará o seu povo do exílio e reconduzi-lo-á a sua terra. Deus cuida do seu povo e guia-o até a felicidade.

Tal boa notícia, tal Evangelho é ó próprio Jesus Cristo, Filho de Deus. E é esta boa notícia, é este Evangelho que os evangelistas nos transmitem. É por isso que Marcos, começa o seu evangelho com a seguinte frase: “Início do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus”. Jesus é a boa notícia, é o evangelho anunciado a todos. Jesus é o salvador, é o messias (Cristo), é o Filho de Deus. E o evangelho de Marcos outra coisa não é do que anúncio da boa-noticia desconcertante da identidade de Jesus.

A anunciar esta boa notícia, que já estava prometida pelos profetas, aparece-nos, no evangelho de hoje, João Baptista. Na verdade, é da missão de testemunho de João Baptista sobre Jesus que nos fala o evangelho deste domingo.

Marcos apresenta João Baptista a partir de um conjunto de afirmações retiradas do Êxodo, do profeta Isaías e do profeta Malaquias. Com tais referências vetero-testamentarias, Marcos quer indicar que João Baptista é aquele, que segundo o Antigo Testamento, Deus enviaria a anunciar e a preparar a intervenção definitiva de Deus na história.

Segundo Marcos, tal preparação foi feita no deserto e com um convite a um baptismo de penitência no rio Jordão. O deserto coloca-nos novamente diante do êxodo do Povo de Deus. O deserto é, segundo a teologia de Israel, o lugar onde o Povo realizou uma caminhada de conversão e de purificação. É assim que João, no deserto, convida o povo a arrepender-se e a converter-se dos seus pecados através de um baptismo de penitência.

Ante o convite de João, grande número de pessoas vindas da Judeia e de Jerusalém, eram baptizadas por ele no Jordão. Na verdade, segundo a mentalidade judaica, antes de o Messias chegar, o povo de Deus, através de um caminho de conversão e de penitência, devia tornar-se num Povo Santo. O grande número de pessoas que se baptizaram mostra o caracter decisivo do convite de João. O convite de João não é simplesmente mais um convite mas é o último apelo de Deus ao seu povo. Na verdade, João é o profeta Elias que deveria voltar a aparecer para anunciar a chegada do Messias. O estilo de vida de João (vestido de pele de camelos, com um cinto de cabedal e a alimentar-se de gafanhotos e mel silvestre) evoca o estilo de vida do profeta Elias. Tal identificação de João com Elias, mostra que João é o mensageiro da chegada iminente do Messias.

E do Messias dá João Baptista testemunho. O Messias terá como características a força e o Espírito. O Messias será aquele que com a força de Deus dará o Espírito à humanidade.

Da vinda de Deus à história humana, mas desta vez da vinda gloriosa de Cristo que instaurará “os novos céus e a nova terra onde habitará a justiça”, nos fala a segunda leitura deste domingo retirada da segunda epístola de São Pedro. Este escrito do Novo testamento, que parece uma carta testamento, é um convite para os cristãos se manterem firmes na sua fé e preparem adequadamente a segunda vinda de Jesus. Na verdade, depois de Pedro indicar alguns dos motivos pelos quais o Senhor ainda não veio (“um dia diante do Senhor é como mil anos e mil anos como um dia … Deus usa de paciência convosco e não quer que ninguém se perca mas que todos se arrependam … o dia do Senhor virá como um ladrão”) pede que os cristãos aguardem esta vinda do Senhor na santidade, na piedade e sem pecado nem motivo de repreensão.

As leituras deste dia falam-nos da intervenção de Deus na nossa história. Deus está sempre presente e sempre pronto a actuar na nossa história. No entanto, nós temos de aceitar esta intervenção de Deus na nossa história. Para aceitarmos o Senhor que vem também nós temos de nos converter e aceitar o perdão de Deus. Aceitar e estar disponíveis ao Senhor que vem exige de nós uma conversão e um estilo de vida concreto. Assim sendo, o tempo de advento não é só um tempo para anunciar que o Senhor Vem. O tempo de Advento é um tempo de prepararmo-nos para a vinda do Senhor. O advento é o tempo de prepararmos o caminho ao Senhor que vem. Só preparando a vinda de Jesus é que podemos de verdade acolher a sua visita salvadora. A vela que devemos acender neste segundo domingo de advento é a vela da conversão.

P. Nuno Ventura Martins

missionário passionista

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