Ano B – XXV Domingo do Tempo Comum

1ª Leitura: Sab 2, 12. 17-20;
Salmo: Sl 53, 3-4. 5. 6 e 8;
2ª Leitura: Tg 3, 16 – 4, 3;
Evangelho: Mc 9, 30-37.


Neste XXV Domingo do Tempo Comum, a Liturgia da Palavra apresenta-nos em contraposição a sabedoria divina, a sabedoria da Cruz, e a sabedoria humana. A primeira leitura do Livro da Sabedoria recorda-nos que quem segue a sabedoria divina torna-se uma interpelação viva para aqueles que seguem o caminho da impiedade e que por isso, muitas vezes, são vítimas da perseguição dos malvados. No entanto, apesar de ser origem de perseguição e de sofrimentos é a sabedoria divina que devemos seguir, porque, como nos recorda S. Tiago na segunda leitura, só seguindo a sabedoria do alto é que podemos viver na pureza, na paz, na compreensão, na generosidade, na misericórdia, na imparcialidade e na verdade. Só seguindo a sabedoria que vem do alto e não os valores do mundo é que podemos ser verdadeiramente felizes. E porque o Senhor Jesus quer que todos os seus discípulos sejam verdadeiramente felizes magistralmente lhes ensina a sabedoria divina que é a sabedoria da cruz e brandamente corrige as suas falsas expectativas baseadas na sabedoria do mundo. 

Aproveitemos também nós o caminho formativo que Jesus, no evangelho deste domingo, oferece aos seus discípulos e nos oferece hoje a cada um de nós. Depois da confissão messiânica de Pedro com o primeiro anúncio da paixão e o convite a que cada discípulo tome a sua cruz (evangelho do último domingo), Jesus prossegue o seu caminho, caminho esse que o levará a Jerusalém, ao monte calvário, à paixão, morte e ressurreição. 

Ao longo deste caminho geográfico, Jesus pretende que os seus discípulos façam um outro caminho, um caminho de formação e de transformação, um caminho que os leve a abandonar a sabedoria do mundo e a abraçar a sabedoria divina, a sabedoria da cruz. E este caminho formativo dos discípulos é algo importante e que não se pode dispensar. É por isso que enquanto “Jesus e os seus discípulos caminhavam através da Galileia. Jesus não queria que ninguém o soubesse, porque ensinava os discípulos”. Jesus preocupa-se por oferecer aos seus discípulos uma boa formação, uma boa preparação para que o possam seguir pelos passos da sua Paixão, Morte e Ressurreição. Por isso, procura a tranquilidade e a calma e fala-lhes abertamente: “O Filho do homem vai ser entregue às mãos dos homens, que vão mata-lo; mas Ele, três dias depois de morto ressuscitará”. 

Jesus fala-lhes claramente sobre o seu mistério pascal, sobre o mistério da sua paixão, morte e ressurreição. É este o conteúdo da formação, mais existencial que teórica, que Jesus ministra aos seus discípulos de Cristo e que outra coisa não pretende que os discípulos vivam uma existência verdadeiramente pascal. 

Ante este ensino de Jesus, o texto evangélico diz-nos e mostra-nos que os discípulos não concordam com ele. Na verdade, a expressão “os discípulos não compreendiam aquelas palavras”, deve ser entendido como uma dificuldade de assimilação causada pela discordância do caminho seguido por Jesus. Na verdade, os discípulos certamente entenderam as palavras claras que Jesus lhes dirigiu. No entanto, não concordavam com essas palavras, com esse caminho de vida que Jesus escolheu e por isso tinham dificuldade em compreender tais palavras. Entenderam as palavras que Jesus lhes dirigiu mas não concordaram com elas. 

Ante esta incompreensão, os discípulos não tem a coragem de interrogar Jesus, de criticar Jesus pelo caminho que está a seguir. Certamente, que a resposta dura que Jesus deu a Pedro, depois do primeiro anúncio da Paixão (“Vai-te, Satanás, porque não compreendes as coisas de Deus, mas só as dos homens”), inibia-os de discutirem com Jesus, porque afinal de contas a sua maneira de pensar segue a sabedoria do mundo e não a sabedoria de Deus. Com medo de que Jesus desmascare a sua excessiva maneira humana de ver as coisas ficam em silêncio, silêncio esse que só será quebrado para discutirem entre si sobre um tema demasiado mundano: quem é o maior?

No entanto, Jesus, que não compreende e não concorda com a sabedoria do mundo, não fica em silêncio e, quando chegou a Cafarnaum com os seus discípulos, na intimidade da casa, pergunta-lhes: “Que discutíeis no caminho?”. Novamente ficaram em silêncio os discípulos, porque bem sabiam que a sua discussão sobre quem seria o maior nada tinha da sabedoria divina. 

A maneira de pensar dos discípulos é demasiado humana. É verdade que na Palestina de então o problema da hierarquização era um problema importante e regulava a vida quotidiana quer na sinagoga quer nos próprios banquetes. Esperando que Jesus fosse o Messias político e triunfante, os discípulos pensavam que era necessário ter muito bem definida a ordem hierárquica entre eles para que assim fosse mais fácil fazer a distribuição dos postos de poder quando Jesus instaurasse o reino messiânico. 

Jesus já lhes tinha dito claramente que o seu messianismo seria o do Servo Sofredor, que o seu caminho seria o da cruz. Mas eles recusavam-se em compreender e aceitar tal caminho. Eles pensam e querem um messias político que venha com poder e majestade e não o Messias crucificado. E, em conformidade com as suas expectativas demasiado humanas, discutem sobre qual deles seria o maior.  

Mas Jesus, não desiste deles e sentando-se os ensina e corrige com um ensinamento e com um gesto. Jesus afirma claramente, porque trata-se do essencial da sua mensagem, que o fundamental na vida dos seus discípulos não é o poder e a grandeza mas o serviço. A lógica do mundo procura o poder e a grandeza e com isso, como nos recorda S. Tiago, na segunda leitura deste domingo, só alcança a destruição e a infelicidade das pessoas, porque “onde há inveja e rivalidade, também há desordem e toda a espécie de más acções … Cobiçais e nada conseguis: então assassinais. Sois invejosos e não podeis obter nada: então entrais em conflitos e guerras”. O fundamental, a lógica que os discípulos de Jesus devem viver é a lógica do serviço: “Quem quiser ser o primeiro será o último e o servo de todos”. Como Jesus oferece a sua vida na cruz para a salvação de todos, também os discípulos devem servir os outros, gastando-se por eles. Só na doação da vida é que se encontra a realização pessoal. 

E como se este ensinamento não chegasse para corrigir a lógica equivocada dos discípulos, Jesus recorre a um gesto: toma uma criança e abraçando-a convida os seus discípulos a acolherem as crianças, porque acolhendo as crianças estarão a acolher a Jesus e ao Pai. É claro que a criança aqui mais do que referir-se aos menores de idade refere-se a todos os homens que são débeis, pobres e desprotegidos. Na verdade, a criança, na sociedade judaica, era alguém sem direitos e por isso é símbolo dos pobres sem direitos e indefesos. O discípulo de Jesus não deve procurar que os outros o sirvam, deve sim servir os outros, especialmente os mais indefesos e fracos, porque quando está a servir os seus irmãos mais frágeis é o próprio Cristo que está a servir. Assim sendo, a maior grandeza do discípulo de Jesus não deve ser o poder mas o serviço. Se a glória do discípulo é servir o seu mestre, os discípulos de Jesus só o poderão servir correctamente através do serviço concreto aos irmãos que mais sofrem, tão concreto quanto as suas necessidades. No reino de Jesus não há cargos de poder e de autoritarismo mas de serviço humilde e atento. 

Que a celebração deste domingo seja um verdadeiro momento formativo e transformador no nosso caminho de discípulos de Jesus. Que a participação nesta eucaristia nos faça compreender que, muitas vezes, a nossa maneira de pensar é demasiado humana e nos ajude a interiorizar e a viver a sabedoria da Cruz que é a sabedoria do serviço.

P. Nuno Ventura Martins

missionário passionista

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