Tríduo S. Paulo da Cruz – 3º dia (19 de Outubro – Solenidade)

1ª Leitura: Is 61, 1-3a;
Salmo: Sl 95 (96), 1-2ª. 2b-3.7-8ª.9-10;
2ª Leitura: 1 Cor 1, 18-25;
Evangelho: Mc 6, 7-13.


Celebrar a Festa de São Paulo da Cruz, nosso fundador, é um voltar as origens. A celebração de um santo é algo que “entusiasma a buscar a cidade futura (cfr. Hebr. 14,14; 11,10) e, ao mesmo tempo, nos ensina um caminho seguro, pelo qual, por entre as efémeras realidades deste mundo e segundo o estado e condição próprios de cada um, podemos chegar à união perfeita com Cristo, na qual consiste a santidade” (LG 50). 

Gosto de pensar que a festa de São Paulo da Cruz, nosso Pai, é um momento em que toda a família, religiosos e leigos que partilham o carisma da Paixão, se juntam a ver o grande álbum de fotografias da família e recordam aquele com quem tudo começou. Neste dia um pensamento deve estar presente na nossa mente: “Lembra-te de quem és!”

Acredito que um dos grandes problemas do nosso tempo é o problema da memória. Esquecemo-nos ou, pior ainda, queremos esquecer-nos de quem somos. Celebrar a festa de S. Paulo da Cruz, nosso Santo Pai e Fundador, é relembrar-nos de quem somos, é recordarmo-nos donde vimos. Nós somos os seguidores de Paulo, e Paulo era um seguidor do Senhor Crucificado. O complemento determinativo “da CRUZ” presente no seu nome já diz tudo. Toda a sua vida, todo a sua razão de ser, todo o seu apostolado eram determinados pelo “da CRUZ”. 

Celebrar o nosso fundador é recordarmos quem somos. Nós somos os seguidores de Paulo e Paulo foi o seguidor do Senhor Crucificado. S. Paulo da Cruz foi aquele que descobriu na cruz aquilo que o homem é capaz de fazer e aquilo que Deus é capaz de fazer. Na verdade, na cruz de Cristo esta exposta aos olhos do homem o gosto pela morte, pela violência, pelo ódio, pela humilhação que habita o homem. Assim sendo, ao olhar para a cruz, o Homem descobre a doença mortal que padece. No entanto, a cruz de Cristo revela-nos outra coisa. Na cruz de Cristo temos bem visível o amor de Deus que nos perdoa e que é capaz de, com a sua graça, subverter a nossa maldade e romper com o círculo da violência. Na verdade, Deus não respondeu à violência humana com violência mas com o dom do seu perdão e do seu amor. E é isto que causa em nós um choque. A morte de Cristo na cruz é eloquente: a eloquência de um amor silencioso capaz de subverter a violência e de nos acolher com o seu perdão. Foi esta a verdade que São Paulo da Cruz descobriu e que de forma exímia traduziu nas frases que tão bem conhecemos: “A paixão de Cristo é a obra mais maravilhosa do amor divino” e “a paixão de Cristo é o remédio mais eficaz contra os males de todos os tempos”. 

Tal descoberta tornou-se missão, uma missão que foi suscitada pelo Espírito Santo. Na verdade, sobre Paulo da Cruz repousou o Espírito do Senhor como repousou sobre o profeta de que nos fala a primeira leitura deste dia. O Espírito repousou sobre Paulo da Cruz e confiou-lhe a missão de tornar frutífera a Paixão do Senhor. A Igreja reconheceu em S. Paulo da Cruz a acção do Espirito Santo e por isso aprovou a congregação passionista cuja missão, é, como nos recorda a segunda leitura deste dia pregar “Cristo crucificado, escândalo para os gentios. Mas para aqueles que são chamados, tanto judeus como gregos, Cristo é poder de Deus e sabedoria de Deus.”

Mas como desempenhou Paulo da Cruz esta missão? Como estamos nós chamados a desempenha-la hoje? Deixemos que o texto evangélico de hoje nos ajude a descobrir a resposta a esta tão urgente questão. A liturgia da celebração deste dia propõe-nos para meditação a leitura de Mc 6, 7-13. Uma perícope evangélica que retracta bem a vida de São Paulo da Cruz e aquilo que ele queria dos seus filhos. Na verdade, podemos ler nas constituições da Congregação Passionista que São Paulo da Cruz queria que os seus filhos levassem uma vida igual à dos apóstolos (Constituições, 1). Como era a vida dos apóstolos? Chamados e convocados, foram instruídos por Jesus e depois foram enviados por Ele em missão de salvação pelo mundo e depois disto voltaram aos pés de Jesus contando-lhes tudo quanto tinham feito. 

Também nós fomos chamados pelo Senhor e cada dia somos convidados a reafirmamos a nossa vontade de o seguirmos. Também nós somos diariamente instruídos pelos divinos ensinamentos. Também nós somos enviados em missão como Paulo da Cruz o foi. 

Mas como somos nós enviados em missão? Qual o objectivo? Qual os meios? Que projecto pastoral seguir? O texto evangélico deste dia oferece-nos a resposta.
Muitas das vezes que lemos este texto lembramo-nos logo daquilo que temos de deixar para ir anunciar o evangelho. No entanto, segundo a versão de Marcos, a primeira ordem de Jesus é que levem para a sua missão um cajado. Só depois disto é que diz o que não devem levar. Neste dia não posso deixar de me perguntar: o que significa esse cajado? Que simbolismo terá neste texto evangélico de Marcos? Será que se quer referir unicamente aquele pau que ajuda os peregrinos a caminhar ou quer indicar algo mais?

Se deixarmos a nossa memória actuar lembramo-nos de uma personagem bíblica cuja vida é inseparável de um cajado: Moisés. Foi com o cajado de Aarão que Moisés se apresentou diante do Faraó, foi com um cajado que Moisés abriu o mar para o povo passar, foi com um cajado que Moisés bateu na rocha para que dela brotasse água (cf. Êxodo). Penso que este cajado quer simbolizar Deus que acompanha o seu povo na sua caminhada e missão e que é a sua força e vida.

O cajado que Paulo da Cruz utilizou e que nós estamos chamados a utilizar é a Cruz de Cristo: ela é o nosso apoio a caminhar e é nela que descobrimos o amor de Deus. Tendo Deus a caminhar connosco podemos deixar tudo. Como diz o hino de completas: “nada temo porque vós estais comigo”. Se Deus está connosco podemos deixar de confiar nas seguranças humanas. Confiar nas seguranças humanas é não confiar em Deus que nos acompanha. 

A missão é clara: pregar o arrependimento e curar. Levar as pessoas a pensar e a descobrir que não estão no caminho certo. Apresentar aos homens a cruz de Cristo com toda a sua força para que se crie neles o impacto e “acordem” da anestesia do pecado. Contudo, o mal é uma realidade grave que fere as pessoas. Por isso, também há necessidade de curar, também há necessidade de derramar sobre as feridas da humanidade o óleo da misericórdia, da compaixão e do amor de Deus. Anúncio da Palavra e promoção humana: a tarefa a que estamos chamados!

Passados alguns versículos, descobrimos que em Mc 6, 30 os discípulos voltam para a beira de Jesus. Assim tem de ser. O sucesso do seu empreendimento missionário não dependeu deles mas daqueles que os enviou e que foi o seu cajado durante todo o seu trabalho. 

Que ao celebrar este dia tão importante para todos nós sintamos no nosso coração no meio do desânimo a interpelação “Lembra-te de quem és!” Sem medo e com confiança, abramos o nosso coração à missão. É Deus que nos chama, é Ele que nos forma, é Ele que nos envia e, o mais importante, é Ele que nos acompanha e que age em nós. 

Caríssimos amigos, leigos e religiosos passionistas, recebemos, cada um de nós na diversidade do seu estado de vida, o carisma da Paixão, o mesmo carisma que o Espírito concedeu à Paulo da Cruz para o bem da Igreja, cabe-nos preserva-lo e deixa-lo correr como um rio de água viva que dê vida a este mundo.

P. Nuno Ventura Martins

missionário passionista

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