Ano B – XIII Domingo do Tempo Comum

1ª Leitura: Sab 1, 13-15: 2, 23-24;
Salmo: Sl 29, 2 e 4. 5-6. 11-12a e 13b;
2ª Leitura: 2 Cor 8, 7. 9. 13-15;
Evangelho: Mc 5, 21-43 ou Mc 5, 21-24. 35b-43.


A liturgia da Palavra do XIII Domingo do Tempo Comum garante que o nosso Deus é um Deus de vida empenhado em que os homens tenham vida e a tenham em abundância. 

No entanto, pode acontecer que nós, muitas vezes, não estejamos plenamente convencidos que o nosso Deus é um Deus de vida e não de morte. Na verdade, certos comentários que podemos fazer diante da morte de alguns irmãos nossos do género: “tens que ter paciência porque foi esta a vontade de Deus” ou “foi na hora em que Deus o chamou” deixam passar a impressão de que a morte do homem é obra de Deus e lhe agrada. 

No entanto, a autor da primeira leitura deste domingo, retirada do livro da Sabedoria, deixa bem claro que a morte não é obra de Deus e não lhe agrada: “Não foi Deus quem fez a morte, nem Ele se alegra com a perdição dos vivos”. Na verdade, para o autor do livro da Sabedoria, último livro do Antigo Testamento redigido em grego por um hebreu alexandrino, a morte tem a sua origem na inveja do diabo, no pecado. 

O conceito de vida e de morte não se limita a um simples dado biológico. Quer o nascimento quer a morte biológica fazem parte do nosso processo vital. No entanto, a morte biológica não é o fim de tudo. Como rezamos numa oração pelos defuntos: “Para os que crêem em Vós, Senhor, a vida não acaba apenas se transforma” (Prefácio dos defuntos I). A morte biológica não é o fim de tudo, mas apenas uma passagem para a vida eterna. 

Assim sendo, vemos que a morte de que nos fala o texto do livro da Sabedoria e que é obra do diabo não é a morte biológica mas o pecado que nos impede de viver, de amar e de ser felizes. É o pecado, é a ruptura na nossa relação de amor com Deus, com os outros e connosco próprio que é a morte que devemos temer e da qual Deus nos liberta. Na verdade, a vida é relação e a morte é a não relação. Sempre que não vivemos uma vida de relação com Deus, com o próximo e connosco próprios não estamos vivos mas mortos. 

Deixa-nos então bem claro, a primeira leitura deste domingo, que a vontade de Deus é uma vontade de vida e não de morte. Foi Deus que criou a vida e que restaura a nossa vida. Na verdade, foi para que todos nós tenhamos vida e a tenhamos em abundância que, na plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho Jesus. 

O evangelista Marcos, no texto evangélico deste domingo, testemunha-nos dois casos concretos em que o Senhor Jesus defende e restaura a vida: a cura da mulher com fluxo de sangue e a ressurreição da filha de Jairo. 

O evangelho deste Domingo começa com o pedido de Jairo, um dos chefes da Sinagoga, a Jesus para que cure a sua filha que está doente. Jesus, atendendo ao pedido deste pai, foi com Jairo e seguiam-nos uma grande multidão que apertava Jesus. É neste contexto de confusão que o evangelista Marcos nos conta o episódio da mulher com um fluxo de sangue que decide tocar no manto de Jesus e que é curada. 

Durante doze anos esta mulher tinha sofrido de um fluxo de sangue e tinha gasto todos os seus recursos em médicos no intuito de se curar mas em vez de melhorar cada vez piorava mais. Além disto, a doença que esta mulher sofria não era só algo que tivesse consequências a níveis físicos. Na verdade, a lei considerava as mulheres que sofriam de perdas de sangue como impuras e por isso estava-lhes vedado a participação na vida cultual e social.

Ante esta situação, a mulher tem fé na pessoa de Jesus (“Se eu, ao menos, tocar nas suas vestes, ficarei curada”) e é essa fé que a leva a vencer as barreiras da exclusão e da multidão e a aproximar-se de Jesus. E o encontro com Jesus devolveu a vida a esta mulher. 

No entanto, Jesus apercebe-se do sucedido e pergunta: “Quem tocou as minhas vestes?”. Na verdade, Jesus está atento a todos e a cada um. Nenhum de nós, com os seus próprios problemas e fragilidades, lhe é indiferente. 

A mulher, ante a pergunta de Jesus, reconhece aquilo que fez. No entanto, Jesus não a critica por ter violado a lei da pureza mas elogia a sua fé: “Minha filha, a tua fé te salvou”. Não há nada nem ninguém que nos possa impedir de nos encontrarmos com Jesus. Por muitos e graves que sejam os nossos pecados, o nosso encontro sacramental com Jesus, no sacramento da reconciliação, perdoa-nos os pecados e devolve-nos a vida. A própria resposta de Jesus à mulher, resposta de acolhimento e não de exclusão, devem estimular-nos a aproximarmo-nos de Jesus cheios de confiança apesar das nossas situações de pecado. 

Além disto, a exemplo de Jesus também nós devemos acolher todos os nossos irmãos, mesmo aqueles mais impuros, e ajuda-los a sair desse estado de infelicidade. O cristão não pode compactuar com a marginalização. A exemplo de Jesus, os cristãos tem de acolher mesmo os impuros e ajuda-los a sair e a vencer a sua impureza. 

Terminado o episódio da cura desta mulher com um fluxo de sangue, o texto evangélico volta a centrar-se na filha de Jairo. Na verdade, neste momento, chega um emissário que informa Jairo que a sua filha morreu e que já não vale a pena incomodar Jesus. No entanto, Jesus ouvindo isto pede a Jairo que não tenha medo e que tenha fé. Assim sendo, Jesus, acompanhado por Pedro, Tiago e João, dirige-se para a casa do chefe da sinagoga. Chegados aí, encontram todos a chorar e a gritar. Jesus dirige-se aos presentes e diz que não vale a pena esse alvoroço porque a menina não morreu mas apenas está a dormir. Tal afirmação de Jesus provocou uma gargalhada nos presentes. No entanto, Jesus com os seus discípulos e Jairo entra no quarto onde estava o cadáver da menina e ordena-lhe: “Menina eu te ordeno levanta-te” e ela levantou-se e começou a caminhar e tudo isto maravilhou os presentes. 

Mesmo diante de situações que nos parecem impossíveis de resolver, como é o caso da morte, Jesus pede-nos que não tenhamos medo e que tenhamos fé e confiemos nele. Mesmo nas situações mais complicadas e mais graves não devemos perder a nossa fé e a nossa confiança no Senhor. Na verdade, para Deus não há situações irrecuperáveis, não há impossíveis e Ele deseja arrancar-nos dos nossos túmulos e fazer-nos viver a vida nova da graça. Quem tem fé, acredita e confia no Senhor, também hoje pode ressuscitar para a vida nova mesmo que a sua situação de morte e de pecado sejam muito grandes.

O apóstolo S. Paulo, na segunda leitura deste domingo da sua segunda carta aos cristãos de Corinto, transmite-nos, com outras palavras, o interesse e a acção de Jesus em nos dar vida: “Conheceis a generosidade de Nosso Senhor Jesus Cristo: Ele que era rico fez-se pobre para vossa causa, para vos enriquecer pela sua pobreza”. Motivado pelo exemplo de Cristo e pela necessidade de criar condições de igualdade o Apóstolo Paulo, na leitura de hoje, pede que os cristãos de Corinto sejam solidários e partilhem os seus bens com os que menos tem, neste caso com os cristãos de Jerusalém: “Aliviai com a vossa abundancia a sua indigência”. 

Na verdade, nós, a exemplo de Cristo, devemos empenhar-nos e trabalhar pela defesa da vida humana e esta defesa e empenho passa pela partilha daquilo que temos e somos. 

Que a celebração deste domingo reavive em nós a certeza de que o nosso Deus é o Deus da vida, um Deus empenhado em libertar o seu povo dos laços da morte e oferecer-lhe condições de uma vida digna. No entanto, este empenho de Deus para que o homem tenha vida e a tenha em abundância, que se revela de forma exímia em Jesus de Nazaré, também nos pede que nós, seguidores de Jesus, continuemos e imitemos o seu exemplo de defesa e promoção da vida humana.

P. Nuno Ventura Martins

missionário passionista

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