Carta do Provincial no dia de S. Paulo da Cruz

Neste dia 19 de Outubro, celebramos a Festa de S. Paulo da Cruz, nosso Pai e Fundador. É Festa, é dia de alegria porque celebramos o nosso Pai, porque celebramos a nossa história, porque celebramos a nossa Família. Este dia leva-nos a olhar para as nossas origens, para o nosso Carisma. É recordar a nossa história e Aquele com quem tudo começou. Recordar é repassar, saboreando, gostando, amando e fazendo presente. Recordar é folhear com amor o nosso passado para amarmos mais o nosso presente e construirmos o nosso futuro tendo mais vivo o sentido de pertença a esta Congregação, viver mais para ela, sentir que é a minha família e que a devo amar, honrar e embelezar mais e mais. Recordar é ir à fonte neste tempo e processo de Reestruturação para bebermos mais dessa pureza original do Fundador, da sua vida e do Carisma que nos legou. Recordar para revitalizar o que está envelhecido ou adormecido, para isto é a Reestruturação.

S. Vicente Strambi, na biografia de S. Paulo da Cruz diz-nos: “tinha uma presença majestosa, mas amável; estatura elevada, olhar vivo e sereno; testa alta e larga; voz clara, sonora e penetrante; maneira de ser cheia de afabilidade e respeito.” Saliento a sua “presença amável”, o seu “olhar sereno” e a “maneira de ser cheia de afabilidade e respeito”. Não são os aspectos físicos que mais cativam, é o seu coração, a sua sensibilidade e amor que mais nos interpelam: a sua “presença amável”, o seu “olhar sereno” e a “maneira de ser cheia de afabilidade e respeito”. Que Pai extraordinário que temos e que belo programa de vida e que exemplo encantador para cada um de nós, tanto no nosso modo de viver em comunidade, como no relacionamento com todos.

Era de constituição física forte, resistente. Vive até aos 81 anos. Uma vida intensa: viagens muito longas e sempre a pé, sempre descalço, mesmo com a neve e o frio intenso do norte e do centro de Itália. Um homem que percorre a Itália anunciando a todos o Amor Crucificado. A comida é a dos pobres, pouca e simples, muitas noites a dormir no chão e ao relento. Impunha-se a si mesmo, penitências, mortificando o seu corpo com jejuns e flagelações, muito próprias do seu tempo, mas que Ele fazia para estar mais próximo do Crucificado e para sentir-se mais, um pobre e no meio dos sofrem. Recordemos o local e a pobreza e doenças das pessoas nas marismas no sopé do monte Argentário, onde fundou o primeiro Convento da Apresentação. Desde ali começou a expandir-se e a frutificar o nosso Carisma, naquele ambiente de pobreza, de silêncio e de profunda vida comunitária e lugar de irradiação e de partida para a missão de anunciar o Amor de Jesus  Crucificado aos pobres. Amor encarnado na vivência comunitária e na missão através do testemunho de Paulo da Cruz e dos “companheiros que reuniu” (Constituições 1). Ali viveu Ele e os primeiros Passionistas, dali partiam para as missões e para ali regressavam para, aos pés do Crucificado e na vivência comunitária, recuperarem as forças.

 

Tudo isto era para Paulo da Cruz, estar mais próximo de Jesus Crucificado, e era a maneira de viver como pobre e estar entre os mais pobres e dos que mais sofrem. Escolheu o apelido: “DA CRUZ”, para dizer que queria viver unido à Cruz de Jesus e à cruz dos pobres e sofredores, para nos dizer o que queria para os Passionistas: que contemplando a Jesus Crucificado, víssemos Nele: “A obra mais maravilhosa do amor de Deus”, “e para que víssemos na Paixão de Jesus o melhor remédio para os males do nosso tempo” e “víssemos Jesus no rosto dos pobres”.

 

Paulo da Cruz era um homem com uma grande força de vontade. Nada e ninguém o afastava do seu ideal, da sua vocação. Nem a tentação duma vida tranquila e sem problemas económicos, que lhe oferecia um tio sacerdote que queria que ele casasse com uma jovem rica e, além disso, deixando-lhe a sua própria riqueza. Paulo sofre e reza, pedindo luz e força. O tio morre algum tempo depois e Paulo fica só com o crucifixo do tio. Aquela é a sua grande riqueza.

Também a pobreza da família e o amor que tinha por ela foram uma tentação, mas que ele venceu com a oração e a sua força de vontade; um dia escreve a um jovem que tinha dúvidas sobre a sua vocação: “Se soubesses as tentações que sofri antes de abraçar esta vida! Os tormentos provocados pelo demónio, a pena que eu tinha da minha família, que eu deixava no meio de grande pobreza, e que punha em mim toda a esperança, as tristezas, o medo; parecia que não aguentava. O demónio dizia que estava enganado e que podia servir a Deus doutra maneira, que não era vida para mim. Não tinha vontade de rezar. Fazia-me horror ouvir a campainha a chamar para a oração. Todos me pareciam felizes, menos eu. Estas tentações foram ainda mais fortes quando se aproximou o dia de deixar a minha pobre casa”.

Paulo da Cruz é firme nas decisões e nada o afasta do ideal de se entregar a Jesus Crucificado e de fundar uma Congregação que, como ele, faça Memória do Amor Crucificado. Mesmo quando vai a Roma, com a intenção de falar com o Papa e é escorraçado pelos soldados, pensando que ele era um maltrapilho ou um bandido, mesmo nessa hora, não desiste e confia naquele Jesus Crucificado, que Ele tanto ama. Deus tem os Seus caminhos, e vai chegar a hora de Deus, vai ser íntimo amigo dos Papas Bento XV e principalmente de Clemente XIV e Pio VI que o visitam com frequência. São os próprios Papas que vão ao encontro do P. Paulo, que sentem a necessidade de visitar o “Santo Padre Paulo”.

Para os Religiosos e para toda a gente ele tem um coração de mãe. É exigente consigo, mas terno e compreensivo para com todos: compreensivo com os Religiosos, muito especialmente carinhoso e atento com os Religiosos jovens, de um cuidado extremo com os Religiosos doentes, exigindo mesmo que nunca lhes faltasse nada, compreensivo e próximo dos pecadores, mesmo dos mais empedernidos, junta-se aos pobres e vê neles o próprio Cristo: “Olhai bem de frente o rosto dos pobres e vereis neles escrito o nome de JESUS”.

Que a exemplo de S. Paulo da Cruz, sejamos constantes e decididos nas nossas decisões, firmes na nossa vocação, fortes para vencermos e ultrapassarmos as “tentações” que o mundo nos vai pondo no caminho, para nunca vacilarmos, nem “olharmos para trás” no seguimento deste Jesus que caminha com o olhar fixo no Calvário e que, como ele, levemos esse amor e esperança aos mais pobres dos pobres, não hesitando, em desprendermo-nos de tudo o que nos afasta dos mais pobres, para estarmos mais próximos deles, como quer o nosso Pai e Fundador.

Que o seu exemplo nos ajude à simplicidade de vida, vivendo do nosso trabalho, mesmo dos trabalhos mais humildes e escondidos, não usando e abusando do chavão da pobreza e ao mesmo tempo servirmo-nos dos pobres para aparecermos, mas vivendo sempre do outro lado do muro, como senhores, mas sim sendo pobres e não “como os pobres”. Que a pobreza seja o nosso estilo de vida e não uma palavra vazia ou de contra testemunho, recordando-nos das Suas Palavras: “A pobreza é o estandarte sob o qual milita a Congregação”. Que o título: “os pobres de Jesus”, como Paulo da Cruz gostava que chamassem aos Passionistas, não sejam palavras que escandalizem, mas sejam vidas que atraiam e interpelam.

Que os Passionistas sejamos essa presença viva do Amor de Deus que brota da Cruz de Jesus, para levarmos esse amor, a fidelidade na gratuidade, o desprendimento, estando com os crucificados, sendo pobres com os pobres, e o sentido da esperança, que brota da Cruz de Jesus, a todo este nosso mundo, tão carente desses valores. Tudo isto, porém, só será real e coerente se primeiro formos um sinal visível destes valores na Comunidade. É ali que tudo começa ou tudo se destrói.

É uma bela coincidência escrever-vos esta mensagem desde a nossa missão de Uíje, depois de já ter passado pela missão de Calumbo, lugares onde os Passionistas não precisam de muito para se sentirem aos pés do Crucificado, ao lado dos crucificados, solidários com as suas cruzes, pobres com os pobres, no meio dum mundo de sofrimento e de pobreza, onde muitas vezes, a única mensagem de esperança a transmitir, é um olhar amigo, uma saudação e um profundo respeito por este povo de irmãos que nos ensina tanto! Só isto é já “Boa Notícia anunciada aos pobres”.

É bela a coincidência o estar reunidos, aqui em Uije, nestes dias, 8 Religiosos Passionistas, para participar na Ordenação de Diácono do Coir. Alfredo Serpa, no dia 16 de Outubro. Que belo sinal de presença encarnada no meio deste povo! Que belo testemunho de desprendimento, de simplicidade e de pobreza, recebemos deste nosso Religioso, que pediu para ser ordenado aqui de Diácono!  Que belo testemunho para este povo!

É bela a coincidência que neste dia de Festa de S. Paulo da Cruz esteja um grupo de Religiosos em plena missão, na Paróquia da Junqueira, Vale de Cambra. Certamente que o nosso Fundador estará a abençoá-los desde o Céu, ao ver os seus filhos a anunciar este amor dum Deus Crucificado.

É uma bela coincidência, que neste dia, 19 de Outubro, o P. Licínio parta numa missão de paz para o Afeganistão. Pedimos ao nosso Fundador, que ele seja um verdadeiro mensageiro da paz, num ambiente de tanta violência, e que S. Paulo da Cruz peça a Jesus, o Príncipe da paz, que o proteja nesta difícil missão.

Todos estes gestos, como muitos outros que se poderiam apontar, dentro da nossa Província, são sinais de que a Congregação Passionista continua fiel ao Carisma de S. Paulo da Cruz num mundo cada dia mais necessitado destes sinais de entrega gratuita e total, duma entrega generosa e para sempre. Que cada um continue a manter vivo este amor à Congregação, neste momento novo da nossa história, em cada ministério que realiza, seja com mais visibilidade, seja no silêncio e na humildade, o importante é que tudo façamos com amor e alegria. Que cada um de nós, a exemplo de S. Paulo da Cruz, procure ser, na Comunidade e na Missão: “uma presença amável, com maneiras de ser cheia de afabilidade e respeito”.

Deixo aqui uma palavra de conforto para todos os nossos doentes ou que estão a sofrer, física ou espiritualmente, tanto Religiosos, como pais ou familiares dos Religiosos, Benfeitores, ou membros da Família Passionista Laical e peço ao Senhor, através de S. Paulo da Cruz, nosso Pai e Fundador, para que a todos abençoe.

P. Laureano Alves Pereira,
Superior Provincial
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