Ano A – Vigília Pascal na Noite Santa

Evangelho: Mt 28, 1-10.

 

Reunimo-nos de noite para celebrar a vigília pascal, a mãe de todas as vigílias, onde celebramos a ressurreição gloriosa e luminosa de Jesus. Na verdade, é na noite que nos encontramos. Encontramo-nos na noite da aparência da vitória do mal. Parece que os inimigos de Jesus conseguiram vencer. Jesus foi crucificado, morreu e foi sepultado. A pedra que foi rolada à entrada do sepulcro de Jesus parece que é o ponto final que se coloca na história de Jesus. Colocam-se guardas e lacra-se o sepulcro para que ninguém se aproxime. Vive-se o silêncio de sábado santo, aquele silêncio que celebra a vitória da morte sobre a vida, da impiedade sobre a rectidão, do ódio sobre o amor, do sofrimento sobre a alegria. Até as mulheres que sempre seguiram Jesus se rendem a este silencio e tem a intenção de ir visitar o sepulcro de Jesus, aquele lugar que representa a falência humana do Reino de Deus anunciado por Jesus. Certamente, não se recordavam ou tornava-se difícil para elas, como também o é hoje para nós, aceitar e compreender a misteriosa sabedoria do grão de trigo: “se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto” (Jo 12, 24). E é no meio da sua dor, da sua não esperança que se dirigem ao sepulcro.

Também nós vivemos envolvidos nas trevas e na tristeza que parecem apagar qualquer raio de esperança que queira surgir. Estamos cansados e desanimados pelo aparente domínio da morte, pelo aparente domínio, sem escrúpulos e sem piedade, dos mais fracos pelos mais fortes. Desanimados e sem esperança acreditamos que não vale a pena lutar por um mundo novo, pelo reino de Deus, porque Aquele que o veio anunciar e instaurar, Jesus de Nazaré, foi morto, crucificado e sepultado. No entanto, há algo que nos move, como moveu as mulheres do evangelho, até ao túmulo de Jesus. E é no túmulo, exactamente no lugar que representa o carácter definitivo da morte, da morte humana mas também da morte de tantos projectos, de tantos sonhos, de tantos ideais, que acontece algo inesperado.

Mateus, o evangelista deste ano litúrgico, conta-nos como as mulheres foram ao sepulcro e, de repente, assistiram a algo a que não estavam à espera: um tremor de terra, um anjo, cujo aspecto era como um relâmpago e cuja veste era branca como a neve, que aparece e remove a pedra do sepulcro. Mateus usa a linguagem bíblica que tem ao seu dispor para mostrar que Deus intervêm. Na verdade, as páginas da bíblia quando querem demonstrar a intervenção de Deus utilizam estas imagens. Assim sendo, não estamos diante de uma reportagem jornalística de um acontecimento mas sim de imagens bíblicas que manifestam a acção de Deus. Na verdade, o momento e o modo da ressurreição, ninguém tenta descrever porque transcende a experiência sensível.

Contudo, a vida de Jesus, a vida de todos os homens e mulheres que sofrem é importante de mais para que Deus não intervenha. Deus intervém e, ao ressuscitar Jesus, vence a morte, vence todas aquelas forças negativas de morte, de ódio, de injustiça que parecem triunfar. O anjo que se senta sobre a pedra do sepulcro celebra o triunfo do Senhor da Vida sobre a morte. Os aparentes vencedores, representados pelos soldados que guardam o túmulo, são vencidos e caem aterrados. A injustiça e a iniquidade são vencidas pela luz gloriosa da Páscoa de Cristo.

Às mulheres é anunciado, por intermédio do anjo, que Jesus Ressuscitou. Mensagem esta que devem anunciar aos discípulos. Comunicação esta que as leva a enfrentar a vida de uma maneira diferente. Anúncio este que as enche do temor e da alegria própria da presença ressuscitadora de Deus na nossa vida. Na verdade, quando elas se encontram com Jesus é a alegria que são convidadas, como diz o texto original em grego.

Também nós nos encontramos muitas vezes no meio de inúmeros túmulos que parecem mostrar o domínio da morte sobre a vida, da injustiça sobre a justiça, do ódio sobre o amor. No entanto, diante da palavra inaudita da Ressurreição de Jesus ganham novo sentido as derrotas e as lágrimas de todos aqueles que são espezinhados pelo poder da morte. Deus intervém e inverte todas as situações de morte provocadas pela malvadez humana. A vida de Jesus e a vida de todos nós é importante de mais para Deus para serem abandonadas ao poder da morte, da injustiça, da calúnia, do ódio e da mentira. Em todas estas situações de trevas, desponta a luz radiante da círio pascal, sinal de Cristo ressuscitado, que contagiando a sua luz vai iluminado e dissipando as trevas. No silêncio aterrador da aparência da vitória da morte soa a suave, encantadora e esperançosa melodia da ressurreição que nos convida a alegria e nos devolve a esperança. E é neste clima que podemos ler as intensas, não só pelo número mas pelo que contam, páginas da Escritura que são proclamadas nesta noite santa: a criação, o sacrifício de Abraão, a saído do Egipto, a libertação da babilónia, as condições do regresso do exílio, a causa do exílio, o coração novo, a existência baptismal e a ressurreição de Jesus. A liturgia da Palavra deste dia convida-nos a recordar a história da salvação e a viver a nossa história como uma história salvífica. Na verdade, ao longo de toda a história da salvação e ao longo da nossa história pessoal Deus sempre nos acompanha.

E depois de termos percorrido as páginas da escritura podemos renovar a nossa identidade baptismal. Na verdade, é pelo baptismo que acontece Páscoa na nossa vida. Outra graça não recebemos no baptismo senão a graça pascal. E é por isto que nesta noite somos convidados a renovar as nossas promessas baptismais e é aspergida sobre nós a água baptismal. No entanto, e para nos advertir do que comporta ser baptizado no mistério Pascal de Cristo, o apóstolo Paulo exorta-nos: “Fomos sepultados com Ele pelo Baptismo na sua morte, para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos pela glória do Pai, também nós vivamos uma vida nova.” Pelo baptismo o cristão participa da morte e ressurreição de Jesus. Pelo baptismo, o cristão rompe com o sistema pecaminoso gerador de morte e ressuscita para uma vida nova. Ser baptizado é viver a vida nova que nasce da Páscoa, aquela vida que sabe que a vida é mais forte que a morte e que o amor vence todos os ódios.

Pelo baptismo e pela participação na eucaristia, memorial da Páscoa do Senhor, encontramo-nos com o Senhor ressuscitado e também a nós a nós é confiada a mesma missão das mulheres do evangelho: ser testemunhas da ressurreição! E este anúncio, mais do que com os lábios, é feito com a própria vida. “A prova de que tu ressuscitaste somos nós Senhor” (Ravasi). O encontro com o Ressuscitado transforma a nossa vida e torna-nos aptos para o anúncio. Não podemos guardar só para nós a alegre notícia da ressurreição. Somos impelidos a correr pelos tortuosos caminhos deste mundo espalhando o suave aroma da ressurreição, devolvendo a esperança aos sem-esperança porque Cristo ressuscitou, a morte foi vencida. Todavia este alegre anúncio não se faz só com argumentos racionais. Faz-se contando, relatando a experiência fundante de encontro com o Ressuscitado. Uma narração sem pressas, porque essa história é a história da nossa vida e é uma história geradora de vida.

Que todos ao participarmos na Vigília Pascal de Sábado de Santo dissipemos as trevas nossa existência com o lume novo que é Cristo ressuscitado, cantemos a alegre melodia da ressurreição, recordemos a nossa história como uma história salvífica, reafirmemos a nossa identidade e (re)nasçamos nas aguas baptismais, celebremos o banquete do cordeiro imolado e anunciemos a feliz notícia da ressurreição, relatando a nossa experiência de encontro com o Ressuscitado e criando laços de uma comunidade de homens novos, de homens ressuscitados, porque ainda são tantos os sepulcros onde reina a morte e que esperam ansiosamente a Páscoa de Cristo, aquela Páscoa que  permite a Páscoa do Mundo!

Aleluia! Cristo Ressuscitou! Votos de uma Santa Páscoa!

P. Nuno Ventura Martins

missionário passionista

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