Ano B – XVIII Domingo do Tempo Comum

1ª Leitura: Ex 16, 2-4. 12-15;
Salmo: Sl 77, 3 e 4bc. 23-24, 25 e 54;
2ª Leitura: Ef 4, 17. 20-24;
Evangelho: Jo 6, 24-35.


Neste XVIII Domingo do Tempo Comum, o apóstolo Paulo continua-nos a recordar as exigências concretas de sermos cristãos. Na verdade, se no Domingo anterior o apóstolo recomendava a “que vos comporteis segundo a maneira de viver a que fostes chamados”, hoje, na sua carta aos cristãos de Éfeso afirma: “é necessário abandonar a vida de outrora e pôr de parte o homem velho [….] revesti-vos do homem novo”. Na verdade, os cristãos pelo seu baptismo morrem ao homem velho e nascem homens novos. Assim sendo, a vida dos cristãos não deve ser marcada pelas obras do homem velho mas pelas obras do homem novo.

A Carta aos cristãos de Éfeso que escutamos hoje na segunda leitura é uma carta circular que o apóstolo Paulo envia a algumas igrejas da Ásia menor desde a prisão. Esta carta, síntese madura e bem elaborada da teologia de Paulo, contem uma parte parenética, ou seja, contem uma parte exortativa onde o Apóstolo Paulo anima os cristãos a serem coerentes com o seu baptismo, com a sua adesão a Cristo. Na verdade, ser cristão não é uma questão de nome mas é um estilo de vida concreto. O trecho da segunda leitura deste dia pertence a secção parenética desta carta. 

Paulo pede insistentemente que os cristãos abondem o homem velho, a vida antiga marcada pela futilidade e pela corrupção dos desejos enganadores e que se revistam do homem novo marcado pela justiça e pela santidade. Paulo pede-nos que sejamos coerentes. Na verdade, todos nós afirmamo-nos cristãos, dizemos que fomos baptizados e nos tornamos novas criaturas e filhos de Deus. No entanto, será que estamos a viver verdadeiramente a vida nova dos filhos de Deus? Será que somos verdadeiramente homens e mulheres novos? Será que verdadeiramente conhecemos Jesus e o seu estilo de vida? Ou será, que em nada a nossa vida se distingue daqueles que não acreditam? Pode acontecer que apesar de sermos baptizados estejamos ainda a viver a mesma vida de antes. 

A nossa fidelidade a Cristo, o nosso esforço e empenho em deixarmos o homem velho e sermos homens novos nem sempre são fáceis. Há momentos em que nos pode apetecer voltar para a escravidão do pecado, do homem velho e deixar a vida do homem novo marcada pelo amor, justiça, paz, santidade, graça e vida. A nossa caminhada de homens novos é uma caminhada de esforço continuo. No entanto, não devemos desanimar porque Deus está connosco e nos ampara no nosso esforço e nas nossas dificuldades em nos renovarmos e nos revestirmos do homem novo. Deus está connosco neste caminho de libertação do pecado em direcção à vida nova da graça, à liberdade.

Desta presença de Deus na caminhada do povo da escravidão do Egipto à terra prometida nos fala a primeira leitura deste domingo retirada do livro do Êxodo. A primeira leitura deste domingo insere-se no contexto da caminhada do povo pelo deserto em direcção à terra prometida. Depois de Deus libertar o povo da escravidão do Egipto, este inicia a sua marcha pelo deserto em direcção à terra da promessa. No entanto, nem tudo é fácil neste caminho de libertação. Na verdade, as dificuldades vão-se sentindo. A leitura deste dia conta-nos a dificuldade da fome que o povo sentiu. Ante esta dificuldade, o povo começa a murmurar contra Deus e por muito estranho que pareça até desejou voltar a ser escravo: “Antes tivéssemos morrido às mãos do Senhor na terra do Egipto, quando estávamos sentados ao pé das panelas de carne e comíamos pão até nos saciarmos”.   

O povo de Deus, mesmo depois de ter visto as maravilhas que o Senhor realizou para liberta-los da escravidão do Egipto, ainda não aprendeu a confiar em Deus e a segui-lo com confiança. No entanto, Deus não se cansa de se revelar ao povo como o Deus bondoso, solicito e preocupado com o seu povo. Deus não se cansa de mostrar que acompanha o homem no seu caminho da escravidão do Egipto à liberdade na terra prometida. Assim sendo, Deus dá ao seu povo faminto maná e codornizes que matem a sua fome. 

Quer o fenómeno do maná quer o fenómeno das codornizes são dois fenómenos naturais que ainda hoje se verificam. Na verdade, as codornizes, durante a sua migração entre Africa, Ásia e países mediterrâneos, na época do outono e da primavera, devido ao seu cansaço tornam-se uma presa fácil para os beduínos. O maná, por sua vez, é a secreção esbranquiçada de um arbusto chamado tamarix mannifera que cresce no deserto do Sinai. No entanto, estes fenómenos naturais foram lidos com os olhos da fé. Para o povo quer o maná quer as codornizes são alimentos que Deus concedeu ao seu povo ao longo do seu caminho, são dons de Deus que mostram a protecção e o amor de Deus para com o seu povo. Além disto, o maná também será uma prova para o povo: “Vou fazer que chova para vós pão do céu. O povo sairá para apanhar a quantidade necessária para cada dia. Vou assim pô-lo à prova, para ver se segue ou não a minha lei.” O maná será uma prova porque o povo só deverá recolher a quantidade necessária para cada dia e não deve acumula-lo. Assim sendo, o maná é uma prova a ver se o povo realmente confia ou não confia em Deus, se confia ou não confia na providência divina. 

Muitas vezes, ante as dificuldades que sentimos no nosso caminho de despojarmo-nos do homem velho e de nos revestirmos do homem novo sentimo-nos desencorajados e tentados a voltar atrás. Nesses momentos, desejamos que Deus interviesse de uma forma espectacular. E tão interessados e ansiosos estamos por uma intervenção divina prodigiosa que podemos estar a desperdiçar tantos sinais de amor, de bondade que Deus nos presenteia todos os dias. Na verdade, as nossas motivações na nossa vida de fé podem estar algo equivocadas. 

O evangelho deste dia fala-nos um pouco disto. Depois do milagre da multiplicação dos pães e dos peixes que saciou a fome a 5000 homens, Jesus foi para Cafarnaum e a multidão, ao dar conta que nem Jesus nem os discípulos estavam no lago, foi à procura de Jesus. Encontrando Jesus, a multidão pergunta-lhe quando ai tinha chegado. Jesus não lhes reponde a essa pregunta mas adverte-os sobre as verdadeiras motivações que levaram a multidão a procurá-lo: “vós procurais-me, não porque vistes milagres mas porque comestes dos pães e ficastes saciados. Trabalhai não tanto pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que dura até à vida eterna e que o filho do Homem vos dará”. Jesus começa por esclarecer qual deve ser a verdadeira motivação da fé, de irmos até Jesus. Não devemos ir até Jesus à procura de milagres, de soluções fáceis para os problemas. Devemos ir até Jesus à procura daquele alimento que dura até à vida eterna e que é Ele mesmo: “Eu sou o pão da vida: quem vem a mim nunca mais terá fome, quem acredita em mim nunca mais terá sede”. Jesus é o verdadeiro alimento que sacia a fome de felicidade e de sentido do homem. Jesus é a resposta última para a pergunta do Homem. A sua palavra e a sua mensagem são o caminho seguro pelo qual o homem pode alcançar a verdadeira qualidade de vida, a verdadeira felicidade, a vida eterna. Assim sendo, torna-se necessário “acreditar naquele que Deus enviou”, torna-se necessário acreditar em Jesus, confiar na sua pessoa, dar crédito à sua mensagem. Só acreditando em Jesus é que teremos acesso a esse pão que dura até à vida eterna. 

Na nossa caminhada do homem velho em direcção ao homem novo muitas vezes sentimo-nos, ante as dificuldades do caminho, tentados a abandonar tudo e a voltar à escravidão do pecado. Nesses momentos desejaríamos uma intervenção de Deus espectacular que dissipasse as nossas dúvidas. No entanto, esse não é o modo de Deus actuar. Ele mostra a sua bondade e a sua companhia em coisas simples e até banais. Ele garante-nos que só Jesus é o pão da vida que mata a nossa fome mas pede-nos que acreditemos nele e que continuemos o nosso caminho porque ele está connosco a alimentar-nos e a fortalecermo-nos nesta caminhada.

P. Nuno Ventura Martins

missionário passionista

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